Publicada em 7 de abril
Blog Política Sociedade Anônima
Nossas crianças têm sido submetidas quase diariamente a notícias sobre corrupção, fraudes, roubos aos cofres públicos, renúncias para impedir cassações. Todo o tipo de articulações ilícitas contra o Brasil e os cidadãos honestos. O resultado também aparece fartamente na mídia: hospitais públicos sem médicos e equipamentos, escolas sem professores e com instalações precárias, crescimento da criminalidade. E mais: novelas, filmes, reality shows e outros entretenimentos de massa que aparentam retratar a realidade, apresentando sucessões de adultérios, trapaças, banalização do sexo e valorização do sucesso, do mais esperto, do mais forte, da violência, da beleza inatingível e do autocentrismo. Ética? Cidadania? Parece que não dá muita audiência.
Como os pequenos brasileiros estão em processo de formação do caráter e personalidade, corremos o sério risco de que fique em suas mentes a impressão de que tudo isso é normal, que o desrespeito é o comportamento padrão dos adultos. Precisamos reagir, mostrar a essas crianças que ética e cidadania são valores existentes também fora do núcleo familiar. A escola é o melhor espaço para isso, facilitando a compreensão da sociedade e fortalecendo o ânimo pela busca de uma realidade mais justa e cidadã.
É verdade que os Parâmetros Curriculares Nacionais, elaborados e implementados pelo Ministério da Educação, já contemplam temas transversais voltados para responsabilidades em relação à vida pessoal e coletiva. Excelente. Isso deve ser mantido e intensificado em todas as disciplinas. Mas acredito que podemos ir além, de forma mais eficaz, oferecendo aos alunos do Ensino Fundamental aulas especificamente voltadas para importantes lições não apenas sobre ética e cidadania, mas também sobre pluralidade cultural, preservação do meio ambiente, convivência com a diversidade e respeito ao próximo.
Não tenho a ilusão de acreditar que a inclusão dessa disciplina na grade curricular será a salvação do Brasil, a solução para os desvios de conduta na política ou nos relacionamentos pessoais e sociais. Mas tenho a certeza de que será a oportunidade de apresentar aos jovens um parâmetro de comportamento íntegro, um auxílio para compreender que a essência do ser humano é, sim, buscar a justiça, podendo distinguir o que é bom do que é ruim, o que é válido do que é irregular, o que faz bem do que contraria tudo o que se deseja para a vida em sociedade. Uma chance para o resgate dos valores que todos prezamos.
Por isso indiquei ao Ministério da Educação a inclusão da disciplina Ética e Cidadania na grade de matérias escolares em todo o País, já nos anos finais do Ensino Fundamental. A Secretaria de Educação Básica do Ministério está analisando a proposta, que foi inspirada na salutar experiência vivida em Barra Mansa. Desde 2008, as escolas daquele município fluminense oferecem a seus alunos a disciplina Ética e Cidadania. As aulas são ministradas por professores de Filosofia aprovados em concurso público, e os estudantes ganham subsídios para enfrentar com bom senso questões polêmicas que fazem parte do cotidiano — em casa, na rua, na vida pública. Isso facilita que a escola se consolide como espaço de formação integral do cidadão, estimulando a inteligência e o respeito, em vez de ser um lugar para decorar informações.
Claro que o conteúdo dessas aulas não se extinguirá na sala de aula. São temas que instigam, interessam, serão levados ao bate-papo no recreio, nas brincadeiras e até nos grupos de relacionamento da Internet. Mesmo que não sejam propriamente o tema da conversa dos estudantes, a semente da ética e da cidadania já estará plantada na mente, no caráter. Afinal, em diferentes escalas, os jovens acabam por reproduzir as práticas que presenciam, que discutem, que assimilam.
A responsabilidade pelas lições de ética e cidadania para nossos pequenos brasileiros não caberá apenas aos professores. Eles serão os agentes e coordenadores de uma síntese mais sistematizada para esta lição, um momento mais concentrado e didático. A aula propriamente dita vai durar 24 horas a cada dia. E os educadores serão também as famílias, o governo, a mídia, empregados e empregadores, os movimentos sociais, os partidos, os políticos. Ensinando às crianças e aprendendo com elas. Precisamos compartilhar com exemplos reais o trabalho pela construção de um valor fundamental que só funciona verdadeiramente com ética e cidadania: a democracia plena.
Hugo Leal – Deputado Federal (PSC-RJ).